“Amarás o teu próximo como a ti mesmo”
(Mt 22, 39; cf. Rm 13, 8-10)
Estamos
vendo como, para poder progredir para um amor perfeito, o primeiro
passo é amar o outro como eu me amo. É preciso conhecer-se no profundo
do coração, conhecer os próprios limites, feridas, dons, capacidade.
Tudo isso exige um caminho, porque não é nada fácil se conhecer e se
amar.
Tantas vezes lutamos e ficamos com raiva
de nós mesmos por saber por que temos determinadas reações e
comportamentos, que nos deixam de boca aberta. Acontece também de nos
sentirmos tão difíceis, tão complicados, que desistimos de tudo, embora
seja forte o desejo e a necessidade ir além dos nossos erros e feridas
interiores. Quantas pessoas encontramos deprimidas, esgotadas, que não
se aceitam, chegando ao limite de se rejeitar e procurar compensações na
droga, álcool, sexo depravado e, no final, caem ainda mais, chegando ao
fundo do poço, abandonando-se em um nada que leva à morte?
Creio
que todos nós temos esta experiência devido ao tipo de vocação-carisma
de cuidar dos últimos, pequeninos, pobres, abandonados, que Deus nos
deu. Quantos deles chegaram ao limite da morte física e espiritual
porque não se aceitaram, sentindo-se fracassados na vida familiar, no
trabalho, nos relacionamentos com os outros. Decidiram se matar, matar o
seu próprio ser, se esconder numa vida “de lado”, “de esquina”, tendo
na mão uma pedra de crack, uma garrafa de álcool ou jogando-se num
barzinho fétido com uma garrafa de cerveja na geladeira pronta para uso.
Amar
a si mesmo não é nada fácil, exige uma escolha pessoal constante, tendo
a coragem ir além dos próprios fracassos, lutando contra muitas
dificuldades e imprevistos, às vezes com fantasmas desconhecidos que
habitam o próprio inconsciente. Lutando sem ver resultados, sentindo-se
fraco, sem forças, procurando alguma coisa que o convença a desistir da
luta, tornando-se um nada, vencido, não se reconhecendo, nem
reconhecendo os outros e Deus.
Aqui nasce uma
realidade terrível: temos medo de nós mesmos, das nossas reações
incontroláveis… temos medo por nós mesmos. É o medo de perder a
identidade, de não saber mais quem somos. Sentimo-nos ameaçados no mais
profundo pelas próprias forças demoníacas que habitam nosso
inconsciente. Parece que tudo e todos que vivem ao redor são e vivem
somente pensando modos de como nos destruir. A situação, assim, se torna
sem retorno e tudo leva ao pânico, à autodestruição.
Jesus
é totalmente contrário a estes pensamentos destruidores. Ele nos diz
para amarmos os outros, mas, primeiramente, amar-se a si mesmo. Ele
acredita em nós e vai além das feridas, pesadelos, limites,
dificuldades. Repito: ele acredita em nós! Tem confiança na nossa pessoa
e nos responde dizendo-nos que quem não perder a sua vida por Ele não é
digno d’Ele. Ele nos pede para amarmos a nós mesmos, encontrando-nos no
outro e, sobretudo, n’Ele, que é o Outro por excelência.
A
chave, então, é esta: eu me encontro, eu me amo, eu me conheço se amo e
não espero nada dos outros. Eu tenho todas as capacidades e dons
recebidos de Deus na minha natureza para amar-me e amar os outros e
descubro estas capacidades somente se me amo por primeiro e se a minha
vida é dada exclusivamente para os outros. O segredo para viver o
primeiro grão do amor, que é amar os outros como eu me amo, passa por
esta escolha: amar por primeiro. Eu me amo acreditando que tenho em mim
mesmo todas as forças, capacidades, para amar-me e amar sem medida os
outros.
Este passo é bem concreto e real. Por
exemplo: se uma pessoa me calunia, eu decido amá-la primeiro. Outra
pessoa tenta me afastar de um amigo, eu a amo por primeiro e faço de
tudo para ser a chave da reconciliação entre todos. Acontecendo uma
situação onde não se vive o perdão na fraternidade, no grupo Arco-Íris,
no Talita Kum, nos grupos de casais, eu sou o primeiro que se move para
procurar a reconciliação, o diálogo, a compreensão, a descoberta e
destruição das coisas confusas que criam ruptura. Não espero que o outro
me procure ou procure ser ele o reconciliador, eu faço de tudo para
amá-lo primeiro.
Estes dias, eu estava com um
pai. Havia mais de um ano que não falava com a filha. Ela chegou até a
colocá-lo na Justiça para receber dinheiro dele. A situação parecia sem
volta e a menina projetava outros motivos contra o pai. Eu, que olhava
“de fora”, percebi claramente que a revolta contra o pai era devida a
uma necessidade escondida, profunda, de querer o pai de volta para ela
e, não podendo tê-lo, isto estava se transformando em ódio violento. O
sentimento de um pai é sempre, no fundo, o amor para os filhos, não tem
jeito!
O pai decidiu perdoá-la e dar o passo de
reconciliação primeiro, sem esperar o amor da filha. Difícil,
humanamente falando, porque significava, para o pai, se abaixar e
permitir à filha pensar que somente ele errou, fazendo da filha uma
heroína destruída pelo desamor do pai. Ainda assim, ele decidiu dar o
passo sem esperar uma resposta positiva da filha. Somente amar!
O
resultado foi um abraço recíproco e, hoje, recebe todo dia um
telefonema da filha, que se preocupa com a saúde e o dia-a-dia do pai.
Este pai descobriu que para amar a filha precisava acreditar em si
mesmo. Ele se deu conta de cancelar, se esquecer do mal que a filha fez
contra ele. Ele se amou a si mesmo, nas suas capacidades, dons, valores
mais altos que um ódio sem fim, que leva à morte, e amou sem querer
resposta da filha. A resposta chegou porque ele amou primeiro.
Devemos
acreditar que nada vale guardar mágoas ou pensar e se convencer, com
raiva, que “somente eu tenho razão”. Não é nada disso. Na vida em Jesus
não é assim. Devo ser eu a compreender que recebi de Deus o dom de amar,
indo além das dificuldades pessoais e alheias. De Jesus compreendemos
que o mundo pode mudar somente se vivemos o primeiro grau do amor: “ama
os outros como amas a ti mesmo!”. Faça esta escolha: ame-se, amando por
primeiro. Tire o orgulho, a vaidade, a soberba do seu ser para,
humildemente, amar sempre sem esperar nada dos outros.
Este
é o caminho da santidade, do verdadeiro amor, que não pretende, mas…
ama! Ama a si mesmo amando os outros sem limites, sempre sendo o
primeiro, mais rápido, intuitivo, imediato no amor e nas escolhas. Irá
fazer o outro feliz e você estará realizado como pessoa. Que na sua vida
os outros possam dizer, olhando-o: é uma pessoa realizada na vida.
Sempre sorridente, sempre disponível, sempre atento, sempre o primeiro,
sempre esquecido dele mesmo, sempre seguro, com resposta sábia e
profunda. Um homem, uma mulher, de Deus que se ama e cuida do caminho de
santidade dele mesmo.
Possa você tornar-se um
exemplo para os outros porque decidiu amar e amar sempre, sem parar em
nenhuma dificuldade pessoal e alheia. Você pode! É somente acreditar
naquilo que Jesus lhe propõe: “ama os outros como te amas!”.
Finalizando,
digo com força: decida-se a amar aquilo que o Jesus lhe oferece, seja o
primeiro de todos. Sim, seja o primeiro, sem esperar a resposta dos
outros.
“Amarás o teu próximo como a ti mesmo”
(Mt 22, 39; cf. Rm 13, 8-10)
Pe. Antonello Cadeddu